ok, quatro e meia da manhã, um hotel 5 estrelas num país miserável, onde as bizarrices mais bizarras acontecem o tempo todo. não sei se eu devia procurar por um bill murray na piscina do hotel, mas como fernando tá aqui meio insone comigo também, acho que não preciso.
o mais perturbador é que você passa pela situação e acha ela bizarra e assustadora, e depois você pensa, mas porra, se fosse um gringo no brasil ia ser a mesma coisa. então você começa a ver como tudo é um pouco parecido também. talvez a gente tenha duas diferenças básicas, uma é a questão do ocidente/oriente, que faz alguma diferença, e que eles já tinham milênios de civilização quando foram colonizados e explorados, né, e a gente não.
vou decepcionar todo mundo que acha que eu vim numa viagem espiritual. vir pra déli é como ir pra são paulo. não é a idéia que você, gringo, tem da índia. é uma metrópole em reforma. não tem muito espírito de preservação cultural. é basicamente um canteiro de obras no meio do deserto. e a cidade inteira tá construindo.
a gente passou 3 dias em gurgaon, que é uma periferia, onde ficam os grandes prédios de empresas chiques, uns prédios iguais àqueles do morumbi, só que no meio do nada. no meio do deserto. e tudo ao redor construindo mais prédios chiques pra contrastar com os taxis bicicleta triciclo.
a bizarrice começou do aeroporto. quando as malas finalmente chegaram, eu tentei ir ao banheiro. veio atrás de mim uma mulherzinha indiana. eu achei que ela fosse do aeroporto (que também tava em obras). ela me mostrou o que fazer como se eu tivesse 2 anos. e depois, claro, me pediu dinheiro. e eu não tinha, porque a gente ainda não tinha sacado rúpias. ela disse que servia euro. disse assim, linguagem corporal. porque sim, todo mundo aqui no mundo dos negócios fala inglês. mas é uma pobreza desgraçada, neguinho vai aprender inglês aonde? então os colegas de fernando falam inglês invejável. mas os motoristas e pessoas de quem você em geral depende pra se locomover por aqui não falam porra nenhuma. aí eu comecei a ficar assustada, né, tava esperando algum assédio, mas não antes de sair da sala de coleta de bagagem.
aí a gente achou o carinha com a placa com o nome de fernando. e não conseguíamos explicar pra ele que precisávamos tirar dinheiro antes de ir pro carro. foi preciso basicamente pegar ele pelo braço e voltar pra dentro do aeroporto até o caixa (isso depois que a gente conseguiu entender onde era o caixa).
depois fomos pro carro e apareceu uma outra criatura. do nada, ajudando a colocar as malas. aí só cabia uma mala atrás.e o cara pegou a mala e saiu andando, teoricamente pra dar a volta no carro e colocar na frente, eu acho, mas aí fernando saiu do carro pra acompanhar e o motorista deu partida e saiu andando com fernando e a mala do lado de fora e eu dentro do carro sozinha. peeeense.
no meio da estrada pra gurgaon à meia-noite neguinho solta a máxima: "excuse me, sir. you problem."
Terror. fernando começa a perguntar "what do you mean?" ou "are you asking if [variações de todos os possíveis problemas que a gente poderia ter ali então]". só que ele não falava inglês. aí ficou mudo. e a gente se preparou pra morrer, né. eu só pensava no trabalho que ia ser levar meu corpo de volta pro brasil. aí eu saquei que ele não entendia frases (até porque antes fernando tinha perguntado "what time will we get to the hotel" e ele olhou pro relógio e disse "time, sir, 12h33") e apelei pra palavras mais simples como "what", e fui diminuindo até chegar no "an?". nada. nem "an?" o cara entendeu.
reza, negada. pra deus. shiva. eu num sabia os nomes dos deuses, só lembrava da estátua e pensava com carinho que queria voltar pra casa.
eventualmente chegamos no hotel. aí fernando foi dizer que precisava de um motorista que falasse inglês. it won't be a problem, sir. all our drivers speak a little english, you just have to speak slowly.
yeah right. as outras versões disso são "he knows exactly where to take you", e eles nunca sabem, "the driver will be here very soon", e eles nunca chegam e "it's very safe, sir" e, né.
igualzinho ao brasil.
vou tentar dormir mais um pouco. ainda tô contando a primeira noite, ok, me lembrem.
=****
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Um comentário:
Desculpa, Sil, mas sua tragédia virou uns 25 minutos de risdas, muita, abertas, bem na frente do pessoal da firma. É bom ler a vida de pessoas para quais a tragédia simplismente não existe. Iú uíll surváive.
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